Continuação:
Por quem sois,
boa gente… então acharam que ERA EU na foto? Eu ainda NÃO FIZ A CIRURGIA e não,
não ANDO ENROLADA EM CELOFANE .
No ano
passado, fui então à consulta com o 1.º cirurgião, o tal que tinha a casa centesimal (não acredito que não
sabia isto), a mais que o 2.º .
Eu até conheço
bem o hospital, mas tenho-vos a dizer que o piso da cirurgia plástica
reconstrutiva é diametralmente oposta do de obstetrícia ou ortopedia (pessoas distintas
vs grávidas e coxos feios).
Foi a hora e
meia mais emocionante que passei, à espera de uma consulta, em toda a minha
vida. Todos se entreolhavam furtivamente, tentando perceber o que levaria cada
um de nós ali. (Eu então, estava possessa, em modo de espionagem soviética).
Eu bem que perscrutei
(narizes, queixadas, mamas de uvas, carecas, flancos gorduchos), mas f…. que me
caia aqui um raio, se aqueles filhos da mãe já não tinham sido todos intervencionados
e iam às consultas de manutenção de pós-operatório.
Outra
hipótese: levavam, como eu, um mega body
redutor (que me custou quase 150€, e que só uso em dias de suplício emotivo), e
que escolhi precisamente para a consulta com o Professor Dr., para esta ser
mais impactante (para ambos).
Chamam o meu
número, levanto-me da cadeira, totalmente embalada a vácuo. Entrei radiosa na sala da consulta, nasci para a Tragicomédia.
O médico tinha
exactamente a mesma cara de cu que aparecia na foto do site do hospital. Eu
sabia tanta coisa da vida pessoal dele que chegava a ser ridículo. O tal escândalo,
a solução encontrada pela Administração Hospitalar, a casa para arrendar em Oeiras
e bem…a parte mais infantil do Hiperfoco: pedi ao Pedro para ver a facturação
da Unipessoal dele, na base de dados empresarial eInforma (à conta disto descobri também a morada de casa).
De mim, ele só
sabia o meu nome (!) (se é que tinha olhado para a agenda).
Pediu para me
despir. Ainda hoje estou traumatizada por ter ido uma vez a um ortopedista (escrevi
isto no blogue, em 2008), que me pediu para despir e para baixar as mãos até aos
pés. Ora a minha pessoa, que ia somente queixar-se de uma hérnia nas costas,
sabia lá que tinha que fazer exercícios e tirar as calças,
ficou ali com
a alma doente e umas cuecas a dizer "follow
me" bem no MEIO DO RABO em letras vermelhas.
Despi-me de
uma assentada, super dramática. Baixo o heróico body até às ancas, Jessica Rabitt desaparece e fica Susana em
modo de Anciã Africana Desnudada, e olho-o de frente, sem medo.
Vejo no olhar
dele um lampejo muito, mas muito breve de surpresa. Os anos de experiência
valem ouro, eu sempre disse. Mas os meus olhos de lince, atentos a qualquer reacção
na pupila, não deixam escapar nada. Tive a confirmação que a minha situação clínica
era, para ele, inesperada e séria.
Manuseou-me as
mamas e, para minha surpresa, em vez de me levantar o avental da barriga,
detém-se nos músculos por cima do umbigo. Estrafega-mos com as duas mãos.
- “ Quantas gravidezes? – inquiriu
- “Duas” - respondi (sei que parecem 14,
mas foram apenas 2)
- “Quantos quilos ganhou?
- “Quase
30 em cada uma”
-“Portanto
60 kgs ganhos, e 60 kgs perdidos.”
Penso que beneficiaria de uma abdominoplastia, com transposição do umbigo
e reparação músculo-aponevrótica.” CREDO.
- “ E o peito?” - perguntei
- “Uma redução mamária também é de ponderar, SE tiver problemas na coluna”.
Roleta russa
de emoções. Por um lado fiquei a saber que lixei os músculos aponevróticos,
sabe Deus o que isso é. Por outro lado, em relação ao peito, aquele “se” fez
tanta diferença. Um brilhante cirurgião plástico (quiçá o melhor), a ajuizar
que uma intervenção nas minhas mamas pelo umbigo (que por seu turno terá que ser
transposto, medo, medo), só se justificaria caso me causassem dores! Oh Joy oh Happiness…
- “Posso
falecer nestas cirurgias?”
- “Sim,
tem riscos associados”
- “Já
lhe faleceu alguma paciente?”
-“ Sim”.
Silêncio.
-“Mas com comorbidades associadas,
decorrentes de cirurgias bariátricas”.
- “Ok”. Saquei da agenda.”Para quando Prof.?”
- “Mas não quer pensar sobre o assunto”?
- “Está
pensado” (e estava, foi um pensamento processado num túnel vertiginoso do hiperfoco)
- Dia 16 de Dezembro, pode ser? As 2 cirurgias ao mesmo
tempo?
- “Sim, mas não é o ideal”.
- “Mas pode?”
- “Sim”.
MARCADO.
Consulta com
2.º cirurgião. Tudo muito similar ao 1.º hospital privado, com excepção da sala
de espera, que era enorme e com toda uma panóplia de consultas de especialidade
misturadas, não deu para perceber quem ia para o quê. Que pena.
Entrei, mandou-me
logo deitar na marquesa. Era um homem muito, muito bonito, especialmente para quem está na antecâmara
da sepultura (63 anos). Atirou-me as mamas para a direita e para esquerda. Levantou-me a barriga e espreitou.
Sentámo-nos. A
conversa foi similar, embora este tenha dito que eu beneficiaria com a redução
mamária, sem demais considerações.
- “Prof. Podemos já marcar na sua agenda, por
favor” (ó Deus, só precisava de um poucochinho menos de impulsividade, um
niquinho).
- “Não
quer pensar antes?”
- “Já pensei. Dia 16 de Dezembro?” (para
ser ainda mais emocionante sair deste imbróglio).
MARCADO. Dois cirurgiões para o mesmo dia e sem qualquer estimativa cirúrgica. Sou oficialmente
uma bomba-relógio. Entretanto, recebo o orçamento operatório de ambos. Um era ligeiramente
mais caro que o outro, mas os dois muito próximos da TOTAL INSUSTENTABILIDADE.
Choro um
bocado e mando um email às respectivas assistentes a perguntar qual seria a
estimativa monetária de apenas 1 cirurgia, a da barriga. Recebo os novos cálculos,
limpo novamente as lágrimas, mas deito mãos ao trabalho.
Num carpimento total,
sofro, poupo dinheiro que sei que não conseguirei juntar até 16 de Dezembro, e por
isso remarco a cirurgia, com ambos (óbvio), para o dia 16 de Abril.
Entrei num
período profissional a que chamei “Honorários da Pança”, pois sempre que tinha
um cliente novo ou extorquisse um antigo, focava-me em poupar uma percentagem
para a cirurgia.
Com que médico?! Não me preocupei com isso,
resolvo muito melhor os problemas sob total pressão. Continuei a adiar. Mas, em Março
deste ano, tinha a consulta com cada um
dos anestesistas, de cada um dos cirurgiões. Chegara o momento.
Googlei-os
novamente. Hiperfoco de 15 minutos para cada um. Pedi ajuda a Deus, pois sei
que isto é assunto sério, embora pareça fútil e pedi orientação espiritual.
Eis
que descubro, no meio de tanta merdice internética, uma Dissertação de um
médico brasileiro para a obtenção do grau de Mestre, cujo Orientador tinha sido
o 1.º cirurgião.
A dedicatória
era terna, sincera, agradecia a sua “Capacidade de análise do perfil dos
seus alunos, pelo seu Dom no ensino da Ciência inibindo
sempre a vaidade em prol da simplicidade e eficiência”. Por instinto, googlei
e esta frase está escrita por praticamente TODAS as dissertações por esse Brasil fora ahahaah!!
Zucas levados da breca!
Mas o TEMA captou-me a atenção. Não era copiado (por isso não posso transcrever aqui), mas era
semelhante a: (…)Competitividade:
OS REAIS FACTORES DE ESCOLHA”.
Ainda a rir-me por causa da dedicatória, escusei-me de ler os factores.... Deus iluminou o meu caminho com sentido de humor. À cautela,
googlei o 2.º médico. Nada de agradecimentos plagiados, poucos Orientandos… era um bonitão, mas era uma seca.
Enviei um
e-mail à assistente do 2.º cirurgião, menti com quantos dentes tinha na boca (Deus
franziu o sobrolho) e cancelei a cirurgia.
A outra ficou marcada para dia 16 de Abril de 2020 e paguei, com o coração
despedaçado, parte dela.
PUMBA! Vírus,
China, mortes, quarentena, pânico, máscaras fpp3. (Eu sei que as minhas
sinapses falham, que sou uma pessoa impulsiva e errática, mas sei reconhecer
uma pandemia quando ela me explode na cara).
Cirurgia desmarcada, claro. Estou
de quarentena, cheia de saúde, cheia de fome e cheia de comida na despensa,
local onde me desloco amiúde e escondo deliciosa comida dos miúdos (pães de
leite, donuts, ovos da Páscoa Ferrero Rocher), atrás de pacotes de amido de
milho e latas de feijão frade.
Não, eles não lêem
este blogue. Só vêem Tik Tok. Comida em segurança. Pança a crescer vertiginosamente.